sexta-feira, 10 de junho de 2016

Por que bandido bom não é bandido morto

Refém de um judiciário ineficaz, de um sistema carcerário inchado e depredado, de uma polícia omissa ou inexistente e de um cotidiano onde a injustiça é regra, não exceção, a população, com sua paciência posta à prova com tantos descalabros, age pra firmar sua própria segurança. Mas a que custo?

Recentemente, em Porto Alegre, no caso conhecido como “Estupro do T1”, uma mulher de 19 anos alegara ter sido violentada por um homem, que a obrigou a descer do ônibus e ir para uma praça, onde, num descuido do bandido, conseguira escapar. Perceba que meu relato é contraditório, não deixando claro se houve ou não o estupro, mas foi assim que as muitas versões ditas por ela – junto de um vídeo do veículo – acabaram por desmascarar sua mentira.

Não se sabe por que ela mentiu, por que prestou um depoimento falso à polícia. Alega-se que ela estaria passando por abalos psicológicos, mas isso não vem ao caso – apesar de que, para um reacionário de plantão, apenas esse caso generalizaria todos os estupros do mundo como mentiras contadas pelas vítimas.

O que ocorreu em seguida que é o verdadeiro problema. Após a divulgação de um retrato falado do suposto estuprador – que nada mais era um auto-retrato de um artista italiano – um homem, que sequer se parece com o desenho do “criminoso”, fora agredido e esfaqueado por moradores.

A ânsia pela justiça não pode levar ao justiçamento, muito menos a uma injustiça. Quem quer fazer o trabalho do judiciário e da polícia e agir por conta própria não quer justiça, quer impunidade, quer justificar-se frente a um julgamento por homicídio dizendo que “matou um bandido” – tornado em vítima – e que isso bastaria para inocentá-lo, ou melhor, para, mais que isso, receber afagos e louvores por seus atos. 

Não. Quem comete um homicídio, por um ato de vingança – travestida de justiça - ou não (isentando a legítima defesa), deve ser julgado como o criminoso morto e pagar por seus atos. Perguntaram-me, o que você faria, se fosse com você, em um caso comprovado? Não sei. Mas se decidisse por sujar minhas mãos em nome de uma falsa honra ou de vingança, eu deveria pagar depois por meus crimes. E que fique bem claro: crimes.

A pena de morte, que muito vêem como uma solução para a criminalidade, em casos parecidos com o do “Estupro do T1”, mal julgados, mal apurados, poderia condenar um inocente. E mesmo que a taxa de pessoas sem culpa condenadas à morte fosse de 0,001% (nos EUA, mais de 4% dos executados pela pena de morte são inocentes), ainda assim alguém morreria pelas mãos do Estado sem ter cometido crime algum, o que é inadmissível. Pergunto eu: e se for com você essa injustiça?

Bandido bom é bandido preso por uma polícia capacitada, julgado por um judiciário eficaz e encarcerado em uma cadeia decente. Aqueles que querem sujar suas mãos como justiceiros, que se juntem aos criminosos.








quarta-feira, 1 de junho de 2016

Eu realmente gostaria que Michel Temer fosse bom

Na nossa queda de braços ideológicas, na nossa incessante busca por ter razão, eu realmente gostaria de estar errado. Eu queria poder aplaudir quem outrora tripudiei, mas o tempo pontua os fatos com clareza e a única frase que encontro dentro de minha lamúria é um grande “eu avisei”.

Não entrarei no mérito sobre a legalidade das ações que levaram Michel Temer à presidência do Brasil, mas suas ações assim que assumiu o cargo interinamente. Quem pensou em uma espécie de renovação nacional, oxigenando a alta cúpula do poder com sangue novo e medidas progressistas, se viu num vortex do passado.

Posicionei-me sempre contra o impeachment, por razões já exploradas em outros textos, neste mesmo espaço, das quais não abordarei, mas assim que de fato se consumou o afastamento temporário de Dilma Rousseff, minha chave girou, me colocando num brete de contradições.

Ao mesmo tempo em que me sentia enojado pelo circo criado em volta do processo de impedimento, eu esperava que os distúrbios cessassem, que Temer, no fundo daquela carapaça de mordomo, pudesse tirar coelhos da cartola e mostrasse-nos um Brasil que até agora ninguém via.

E, de uma forma torpe e desajeitada, mostrou. Trouxe-nos um Brasil esquecido, invisível pelo varrer da história. Um Brasil arcaico, branco, machista e, principalmente, fundamentalista. Um misto de figurões postos à margem do tempo na política brasileira com uma tropa evangélica moralista, pronta pra tecer aos outros aquilo que convém a si.

Com uma equipe formada só por homens brancos, os reacionários, no seu instinto de reação, já alegavam frente às críticas, em jocosas comparações, que os Ministérios não eram os Power Rangers para terem diversidade de cor e sexo; Ministérios eram, diziam, coisa séria, onde os mais competentes deveriam assumir suas respectivas pastas – desde que fossem brancos e homens.

Em duas semanas, dois ministros já foram afastados, devido a áudios vazados, mostrando a intenção dos comparsas de Michel Temer de tentar frear a operação Lava-Jato. Em duas semanas, o Ministério da Cultura foi extinto e recriado, sob o chicote popular. Em duas semanas, o que antes apenas parecia golpe, nos golpeou a face com mais força do que podemos aguentar.

Temer não tem nada de progressista, é um dinossauro forjado no passado e que vive no passado. Um possível retorno de Dilma não garante muita coisa, como Temer não garantiu, mas, pelo menos, dentro de toda sua gama de defeitos, a petista não se vê voltada ao passado, mas sempre em frente, não às pontes do futuro, forjadas com água do mar pelo Governo do peemedebista.

O fato é que eu realmente gostaria que Michel Temer fosse bom e propusesse mudanças não apenas na economia, mas sociais. Porém, infelizmente, apenas comprovou o que todos já sabiam. Agora, de cócoras, enquanto apanho, só me resta dizer: eu avisei.